PCO e a extrema direita

Imagem: Mariano Ruffa
Whatsapp
Facebook
Twitter
Instagram
Telegram

Por FRANCISCO FERNANDES LADEIRA*

O PCO é um partido político cujo objetivo não é necessariamente eleitoral, mas servir aos interesses particulares de seu presidente Rui Costa Pimenta

“O único candidato capaz de derrotar o Lula é Jair Bolsonaro, por isso a perseguição”. A frase que abre este artigo foi compartilhada por Jair Bolsonaro em suas redes sociais. A princípio, poderia ser mais um dos devaneios do ex-presidente inelegível se não fosse um detalhe que chamou a atenção. A frase – que insinua uma suposta perseguição do “sistema” a Jair Bolsonaro para favorecer Lula – foi dita por Rui Costa Pimenta, presidente do Partido da Causa Operária (PCO), organização classificada por muitos como “extrema esquerda”.

No entanto, quem acompanha o cenário político nacional dos anos últimos não se surpreendeu. Trata-se de mais uma etapa da estratégia discursiva do PCO para atrair o público de extrema direita. Ao que tudo indica, foi muito bem-sucedida, haja vista a repercussão positiva da fala de Rui Costa Pimenta entre a bolha bolsonarista.

Isso não significa compactuar com a chamada “teoria da ferradura”, que parte do falacioso argumento de que extrema esquerda e extrema direita seriam opostos de um espectro político linear e contínuo que se aproxima, da mesma forma que o fim de uma ferradura.

Para entender o porquê do (aparentemente paradoxal) interesse do PCO no público do espectro ideológico oposto é importante tecer algumas palavras sobre o modus operandi dessa organização partidária.

Como bem pontuaram Pedro Zambarda e Kiko Nogueira, em live do Diário do Centro do Mundo (DCM), o PCO é um partido político cujo objetivo não é necessariamente eleitoral, mas servir aos interesses particulares de seu presidente Rui Costa Pimenta. Não por acaso, praticamente toda a família de Pimenta ocupa cargos na direção partidária.

Caso se tratasse de uma empresa, não haveria problema algum em empregar parentes, mas o PCO é um partido político que, como tal, recebe recursos públicos (Fundo Eleitoral). Portanto, as contas do partido, em boa medida pagas por todos nós, são de interesse nacional.

Em quase três décadas de existência, o PCO só elegeu um vereador (em uma aliança com a direita, no estado do Amazonas, que os membros do partido fazem questão de ocultar). Ao que tudo indica, o PCO não prioriza as vitórias eleitorais de seus quadros, pois não são raras as candidaturas indeferidas (por motivos banais, como falta de documentos) ou entrega de materiais de campanha para os candidatos somente após os processos eleitorais. “Não entramos nas eleições para vencer, mas para denunciá-las”, diz um dos mantras dos candidatos do PCO. Pura cortina de fumaça para esconder as reais intenções do partido.

Além do Fundo Eleitoral, o PCO obtém recursos financeiros por meio de rifas virtuais, financiamentos coletivos, superchats em canal do YouTube e nas vendas de jornais impressos, revistas e outros produtos em sua loja virtual. Portanto, para os propósitos do PCO, “consumidores” e “engajamento digital” são mais importantes do que “eleitores” e “votos”.

Diante disso, não é por acaso que boa parte dos discursos do PCO se alinha às bandeiras bolsonaristas (cujos adeptos atuam bastante nas redes sociais). Entre as últimas polêmicas do partido estão a campanha pelo voto impresso, a postura negacionista frente à pandemia da Covid-19, a negação de que o 8 de janeiro foi uma tentativa de golpe e a defesa de figuras ligadas ao pensando conservador, como Monark, Maurício Souza, Daniel Silveira, Allan dos Santos, Robinho e Daniel Alves. Nesse flerte com a extrema direita, também foram notórias as participações de Rui Costa Pimenta no Flow Podcast, no canal Arte da Guerra e no programa Pânico, da Jovem Pan.

Outra estratégia do PCO para obter maior engajamento digital (e consequentemente angariar mais potenciais “consumidores”) são as matérias com títulos sensacionalistas publicadas no jornal digital do partido (Diário Causa Operária). Alguns exemplos são categóricos: “Talibã faz mais pelas mulheres do que as feministas histéricas”, “Obrigado, Trump”, “Como as palhaçadas de Boulos levaram ao 7×1 contra a Alemanha”, “Vacina obrigatória: um devaneio autoritário e fascista do STF” e “Luta da mulher não pode ser usada como aríete contra direitos” (sobre a condenação do ex-jogador Robinho por estupro).

Desse modo, o PCO está frequentemente em evidência, sendo alvo de críticas da esquerda por seu “fogo amigo” e recebendo rasgados elogios de bolsonaristas. Maior engajamento digital, maior possibilidade de lucro.  Parafraseando um conhecido programa televisivo: “pequeno partido, grandes negócios”.

*Francisco Fernandes Ladeira é doutorando em geografia na Unicamp. Autor, entre outros livros, de A ideologia dos noticiários internacionais (CRV). [https://amzn.to/49F468W]


Veja neste link todos artigos de

AUTORES

TEMAS

10 MAIS LIDOS NOS ÚLTIMOS 7 DIAS

Lista aleatória de 160 entre mais de 1.900 autores.
Marilia Pacheco Fiorillo José Geraldo Couto Luiz Roberto Alves Eleutério F. S. Prado João Feres Júnior Marcus Ianoni Henri Acselrad Vanderlei Tenório Celso Frederico Priscila Figueiredo Ladislau Dowbor Slavoj Žižek Luiz Bernardo Pericás Flávio R. Kothe Everaldo de Oliveira Andrade Fábio Konder Comparato Fernão Pessoa Ramos João Adolfo Hansen Thomas Piketty Tales Ab'Sáber Flávio Aguiar Carla Teixeira Bernardo Ricupero João Lanari Bo Berenice Bento Henry Burnett Samuel Kilsztajn Salem Nasser Ronald León Núñez Jean Marc Von Der Weid Gerson Almeida Alexandre Aragão de Albuquerque Ronald Rocha Vladimir Safatle Fernando Nogueira da Costa Mariarosaria Fabris Maria Rita Kehl Bruno Fabricio Alcebino da Silva Andrew Korybko Antonio Martins Valerio Arcary Daniel Costa Eugênio Bucci Airton Paschoa Eugênio Trivinho Yuri Martins-Fontes Alexandre Juliete Rosa Mário Maestri Leda Maria Paulani Gilberto Lopes Luiz Werneck Vianna José Luís Fiori José Dirceu Marjorie C. Marona Ricardo Abramovay Ricardo Musse José Machado Moita Neto José Micaelson Lacerda Morais Plínio de Arruda Sampaio Jr. Lincoln Secco Daniel Brazil Luiz Renato Martins Rodrigo de Faria Leonardo Boff Liszt Vieira Dênis de Moraes Gilberto Maringoni Anselm Jappe Luis Felipe Miguel Luís Fernando Vitagliano Paulo Fernandes Silveira Antônio Sales Rios Neto José Raimundo Trindade Atilio A. Boron Remy José Fontana Luciano Nascimento Francisco de Oliveira Barros Júnior Marcos Aurélio da Silva Juarez Guimarães Eliziário Andrade Manuel Domingos Neto Celso Favaretto Luiz Eduardo Soares Paulo Capel Narvai Francisco Fernandes Ladeira Michel Goulart da Silva Lorenzo Vitral Francisco Pereira de Farias Denilson Cordeiro Michael Roberts Benicio Viero Schmidt Ronaldo Tadeu de Souza João Carlos Loebens Leonardo Avritzer Paulo Sérgio Pinheiro Antonino Infranca Lucas Fiaschetti Estevez Alexandre de Lima Castro Tranjan Elias Jabbour Marilena Chauí Luiz Carlos Bresser-Pereira Boaventura de Sousa Santos Alysson Leandro Mascaro Igor Felippe Santos Claudio Katz Luiz Marques Rubens Pinto Lyra Leonardo Sacramento Marcelo Guimarães Lima Paulo Nogueira Batista Jr Ricardo Fabbrini Manchetômetro Daniel Afonso da Silva José Costa Júnior Alexandre de Oliveira Torres Carrasco Otaviano Helene Heraldo Campos Osvaldo Coggiola Carlos Tautz André Márcio Neves Soares Tarso Genro Milton Pinheiro André Singer João Carlos Salles Caio Bugiato Eleonora Albano Julian Rodrigues Marcos Silva Dennis Oliveira Chico Alencar Michael Löwy Sandra Bitencourt Kátia Gerab Baggio Ari Marcelo Solon Armando Boito Andrés del Río Tadeu Valadares Marcelo Módolo Bento Prado Jr. Paulo Martins Annateresa Fabris Rafael R. Ioris Matheus Silveira de Souza Walnice Nogueira Galvão Jorge Luiz Souto Maior Jean Pierre Chauvin Chico Whitaker Alexandre de Freitas Barbosa Érico Andrade Bruno Machado João Paulo Ayub Fonseca Ricardo Antunes Gabriel Cohn Renato Dagnino Sergio Amadeu da Silveira Vinício Carrilho Martinez Afrânio Catani João Sette Whitaker Ferreira Eduardo Borges Jorge Branco

NOVAS PUBLICAÇÕES