Profetas do presente

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Por José Machado Moita Neto*

Os diagnósticos monotemáticos baseados apenas na realidade atual levarão a apostas inconsequentes no futuro

Não se preocupem que não irei atacar àqueles que consultam irmã Janaina. Não a conheço. Apenas pelas peças de publicitárias (marketing) grudadas nos postes de Teresina onde anuncia os seus serviços (búzios, tarôs, etc.). Creio que a empresária, que eu não saberia identificar o setor econômico, cobra por seus serviços especializados.  É certo que a mesma deva concorrer, pelas certezas e consolo que oferece, com as diversas religiões, com os terapeutas, com os coaching e com os políticos.

O dom da profecia autêntico olha um futuro não previsto pela sociedade em sua mesmice. Os profetas foram solitários em suas ideias, pois falavam de um futuro distante. Raros os casos em que o futuro pode ser preparado e até modificado para que a catástrofe anunciada não acontecesse. Um sonho de sete anos de abundância seguido de sete anos de seca desencadearam ações para mitigar seus efeitos. Agora não precisamos sonhar, pois o conhecimento científico anunciou algumas catástrofes possíveis. Por desleixo, nós não nos preparamos adequadamente para todas elas. E as possibilidades são enormes e variadas!

Estamos diante de um tempo singular em que aumentou muito o número de profetas. São profetas do passado, profetas do presente ou profetas do futuro próximo. Aqui a proximidade se mede como menor que o palmo na frente do nariz. Neste sentido, creio que os serviços empresariais customizados ao gosto do cliente mencionados no primeiro parágrafo tenham uma eficiência bem maior (tipo irmã Janaina). De fato, a profecias que tenho lido são meras reproduções ad nauseam do óbvio. O mundo não será o mesmo ou tudo vai continuar como antes são posturas conhecidas na filosofia e na literatura pelo menos há 2500 anos.

A razão menosprezou o sentido. Talvez esta seja um resumo drástico da acusação de Nietzsche sobre a filosofia grega de Sócrates em diante. Contudo, na pós-modernidade, o sentido colapsa a razão e as várias razões particulares a cada ciência se colapsam mutuamente. Falta-nos um projeto ou uma visão de homem e de sociedade na crise ou na normalidade para os próximos 50 anos. Cenário tão grande assim dependeria de criar resiliência (e não soluções) e de ensinar a adaptabilidade a contextos diferentes para os quais exigirão novas habilidades, competências e atitudes, para o normal e para o extraordinário.

Os diagnósticos monotemáticos baseados apenas na realidade atual levarão a apostas inconsequentes no futuro. A sociedade é cada vez mais complexa e é resultado de sistemas acoplados por todas as dimensões do humano. Qualquer redução nestas dimensões da sociedade para melhor atender um destes sistemas levará no descuido dos demais. E isto pode ser fatal na próxima catástrofe que pode não ser na saúde, mas pode ser sobre as conexões virtuais ou em outro campo. Bastaria um apagão no Amazon Web Services (AWS), ou todos os serviços e aplicativos do Google desconectassem ou um fluxo eletromagnético atípico sobre a terra para criar uma catástrofe na vida 4.0 de nossos profetas da atual crise.

Há vagas para profetas autênticos!

*José Machado Moita Neto é professor aposentado da Universidade Federal do Piauí (UFPI).

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