A revolução dos Cravos faz 47 anos

Imagem: Anderson Antonangelo
Whatsapp
Facebook
Twitter
Instagram
Telegram

Por JULIAN RODRIGUES*

Sobrou um cheirinho de alecrim

Eu sei, eu sei.. a Revolução Russa é o paradigma-mor, a Chinesa algo extraordinário, a Cubana, a coisa mais linda que fala tanto aos nossos corações latino-americanos. Porém, todavia, entretanto, contudo confesso: a Revolução dos Cravos , ah a Revolução portuguesa…

O salazarismo, esse fascismo tão singular, quatro décadas de uma ditadura bem ibérica, reacionária e católica. Liderada por um intelectual, manteve alguma distância da radicalidade de Hitlter e Mussolini – Portugal se manteve “neutra” na Segunda Guerra , e não conheceu uma guerra civil  sangrenta como a vizinha Espanha.

Um pequeno país, ainda metrópole colonial, atrasada e pobre, entretanto. O salazarismo não estimulava milícias , mas reprimia brutalmente. A virulência das guerras coloniais na África…

Saber que o Brasil é África, é indígena, mas é  muito Portugal demais. A língua que é um “código secreto”, a herança colonial e suas tensões. E se lá houve aquele bas-fond todo, aqui também talvez role também.

Essa metrópole de  segundo escalão,  sempre a esperar  Dom Sebastião. A aposta no futuro pelo regresso redentor. E não somos nós também desde sempre o país do futuro?

Nem Camões ou Pessoa, claro, puderam estancar a  decadência – uma nação (europeia pero no mucho), encurralada entre  certo passado distante glorioso e remanescências de poderes coloniais.

O velho do Restelo  (Os Lusíadas) teria acertado ? A vaidade e  a cobiça daquela nação quinhetista  que se queria império e se pôs a conquistar o mundo  trariam   fama e glória mas junto com desastres, perigos, tormentas?

Portugalzão. Portugalzinha. Tão pequenina e tão predestinada à grandeza?  Fernando Pessoa  aposta na reconstrução da história e da mitologia da pequena nação heroica (ou será que não?) –  Mensagem foi publicada em 1934, já com Salazar no poder (!)

Ponta da península ibérica, saramagueanamente  jangada pedrogosa –   europeia descolada da Europa. Longe e pertim das américas, ásias e áfricas. Tanto mar, tanto mar. Nossa mãe escravocrata, cruel e espoliadora essa  Portugal.

E  aconteceu a Revolução dos Cravos,  o MFA.. os capitães de abril. O furacão e  posterior derrota (que,  ainda assim, moldou uma nova nação muito mais socialmente justa e moderna).

Por isso tudo que em todo 25 de abril  faço meu ritual: ouvir Grandola Vila Morena milhões de vezes (e muito José Afonso), visitar os sites do PCP, ler algo sobre a história da revolução dos cravos, ouvir  muito Chico cantando as duas versões de Tanto Mar. Segue por aí. Algumas amigas amadas são é minhas cúmplice nessa celebração íntima, ano após ano. (Quem disse que os ateus não tem suas cerimônias e rituais?)

Para entrar no clima, a canção-senha, Grândola Vila Morena:

O nosso Valerio Arcary esteve lá. Um artigo introdutório dele:  “A revolução portuguesa 1974/75: uma revolução solitária”

https://esquerdaonline.com.br/2018/04/25/a-revolucao-portuguesa-197475-uma-revolucao-solitaria/

Depois, é só ver o filme da Maria Medeiros, de 2000 já clássico: “Capitães de Abril”.

https://www.youtube.com/watch?v=M7oeAH1Rj3I

A aula de Rosa Gomes, do GMARX/USP, no curso da Fundação Perseu Abramo (Fascismo, ontem e hoje, façam!)

https://www.youtube.com/watch?v=z0WIhUd86gk&list=PLtsJqckMj3D54LC_yuqUAqn-L8HQ5uC6G&index=9

Gosto muito  também do livro do  Lincoln Secco: “A Revolução dos Cravos: e a Crise do Império Colonial Português “.

https://www.estantevirtual.com.br/livros/lincoln-secco/a-revolucao-dos-cravos/2444154355

Chico (refiro-me à Francisco Buarque de Holanda, nascido em 1944, filho de Sérgio Buarque de Holanda e  Maria Amélia Buarque de Holanda,  o maior artista vivo do país)  em plena ditadura compôs uma música reverenciando  a revolução dos cravos. Queria ele estar naquela festa do povo   português, torcendo para que algo assim aqui.

https://www.youtube.com/watch?v=hdvheuHhF2U

Depois da derrota do impulso revolucionário original, Chico refez a canção, com pequenas e genais adaptações (foi bonita a festa, mas esqueceram uma semente em algum canto)  conservando a beleza estética-política da obra.

https://www.youtube.com/watch?v=ST30-i7cZJk

Estou sentindo algum cheirinho de alecrim, fraquinho.  Escuto sinais, todavia.  Tem flores vindo aí, muitas flores.

Tou vendo uma esperança (viva Henfil)!

Lula Presidente em 2022 é a campanha das nossas vidas.  Não tem nada a ver com uma eleição comum. Trata-se de um tsnunami cultural, político e social. A superação de um ciclo de trevas. O marco de um novo tempo:  vida x morte, civilização x barbárie. O enterro do bolsonarismo e do neoliberalismo!

Mas tudo começa agora. Estamos desafiados a instituir uma disrupção político-cultural-ideológica-programática-ética-estética.

E viva a revolução dos cravos!

*Julian Rodrigues é professor e jornalista, ativista LGBTI e de Direitos Humanos.

 

Veja neste link todos artigos de

AUTORES

TEMAS

MAIS AUTORES

Lista aleatória de 160 entre mais de 1.900 autores.
Michael Roberts Dênis de Moraes Paulo Capel Narvai José Luís Fiori Tarso Genro Luís Fernando Vitagliano Antonio Martins Benicio Viero Schmidt Luiz Renato Martins Salem Nasser Leonardo Sacramento Marjorie C. Marona Francisco de Oliveira Barros Júnior Valerio Arcary Luiz Werneck Vianna Jorge Branco Caio Bugiato José Costa Júnior Luiz Eduardo Soares Boaventura de Sousa Santos Luiz Carlos Bresser-Pereira Slavoj Žižek André Singer José Dirceu Ronald León Núñez Matheus Silveira de Souza Igor Felippe Santos Francisco Pereira de Farias Kátia Gerab Baggio João Sette Whitaker Ferreira Leonardo Avritzer Michel Goulart da Silva Ricardo Musse Yuri Martins-Fontes Maria Rita Kehl Lucas Fiaschetti Estevez Lincoln Secco João Feres Júnior Mariarosaria Fabris Vanderlei Tenório Flávio Aguiar Ricardo Fabbrini Celso Favaretto Tales Ab'Sáber João Carlos Salles Rubens Pinto Lyra Osvaldo Coggiola Carlos Tautz Henry Burnett Ladislau Dowbor João Lanari Bo Alysson Leandro Mascaro João Carlos Loebens Rodrigo de Faria Vladimir Safatle Paulo Fernandes Silveira Marcelo Módolo Carla Teixeira Thomas Piketty Otaviano Helene Paulo Nogueira Batista Jr Walnice Nogueira Galvão Liszt Vieira Lorenzo Vitral Marilena Chauí José Geraldo Couto Eugênio Trivinho Julian Rodrigues Heraldo Campos Fernando Nogueira da Costa Antonino Infranca Bruno Fabricio Alcebino da Silva Jean Pierre Chauvin Andrés del Río Marcos Aurélio da Silva Everaldo de Oliveira Andrade Antônio Sales Rios Neto Gerson Almeida Chico Whitaker Ronald Rocha Milton Pinheiro Remy José Fontana Luis Felipe Miguel Bruno Machado Eliziário Andrade Afrânio Catani Alexandre de Freitas Barbosa José Machado Moita Neto Flávio R. Kothe Renato Dagnino Marilia Pacheco Fiorillo Bernardo Ricupero Eduardo Borges José Raimundo Trindade Atilio A. Boron Sandra Bitencourt Manuel Domingos Neto Alexandre de Lima Castro Tranjan Eleutério F. S. Prado Leonardo Boff Daniel Costa Luiz Bernardo Pericás Jorge Luiz Souto Maior Sergio Amadeu da Silveira José Micaelson Lacerda Morais Alexandre Aragão de Albuquerque Denilson Cordeiro Eleonora Albano Henri Acselrad Elias Jabbour Anselm Jappe Eugênio Bucci Marcus Ianoni Marcelo Guimarães Lima Claudio Katz Marcos Silva Priscila Figueiredo Paulo Martins Berenice Bento Francisco Fernandes Ladeira Bento Prado Jr. Vinício Carrilho Martinez Alexandre de Oliveira Torres Carrasco Ronaldo Tadeu de Souza Plínio de Arruda Sampaio Jr. Ari Marcelo Solon Ricardo Abramovay Mário Maestri Valerio Arcary Gilberto Maringoni Jean Marc Von Der Weid Dennis Oliveira Paulo Sérgio Pinheiro Andrew Korybko Armando Boito Airton Paschoa Daniel Afonso da Silva Luiz Roberto Alves Ricardo Antunes Michael Löwy Fernão Pessoa Ramos Luiz Marques Rafael R. Ioris Celso Frederico Annateresa Fabris Fábio Konder Comparato Luciano Nascimento Samuel Kilsztajn André Márcio Neves Soares Manchetômetro João Adolfo Hansen Gilberto Lopes Tadeu Valadares Gabriel Cohn João Paulo Ayub Fonseca Juarez Guimarães Daniel Brazil Leda Maria Paulani Chico Alencar Érico Andrade

NOVAS PUBLICAÇÕES