Roger Waters no Brasil

Whatsapp
Facebook
Twitter
Instagram
Telegram

Por LUIS FELIPE MIGUEL*

O cantor é o alvo preferencial do lobby sionista

Depois de mais de meio século de uma carreira de enorme sucesso, dá para considerar que as posições políticas de Roger Waters são bem conhecidas. Ele é um ativo antifascista, o que está bem registrado tanto no período do grupo Pink Floyd quanto em sua obra solo.

Pois agora o vice-presidente da Confederação Israelita do Brasil, Ary Bergher, quer impedi-lo de se apresentar no Brasil, por ser “nazista”.

Ary Bergher é um notório bolsonarista. Ficou conhecido por agredir uma senhora de 88 anos que falou contra o então candidato, em 2018, num festival de dança no Clube Hebraica: “Sua ladra, filha da puta, vou te matar”.

A repercussão do caso fez Ary Bergher renunciar à presidência da Federação Israelita do Rio de Janeiro. Como faria depois seu “mito”, pôs a culpa em “possíveis efeitos colaterais adversos de medicamentos que passei a usar recentemente”. Acredita quem quiser.

O que incomoda em Roger Waters é o antifascismo, o antirracismo. O cantor sempre se manifestou em favor de causas igualitárias. Foi ativo na luta contra o apartheid sul-africano. Denunciou Jair Bolsonaro em sua última turnê brasileira. E hoje, coerente com esse antifascismo e antirracismo, está engajado na campanha BDS – por “boicote, desinvestimento e sanções” contra o Estado de Israel, até que seja interrompida a ação genocida contra o povo palestino.

Por isso, é alvo preferencial do lobby sionista.

A denúncia absurda de apologia ao nazismo faz parte deste assédio. Foi inventada na Alemanha.

No meio do show ele usa um uniforme que remete ao nazismo? Sim. É uma referência a The Wall: o álbum, o filme (dirigido por Alan Parker), a ópera-rock. Há ali tanto a memória da Segunda Guerra Mundial quanto uma inspirada crítica à sociedade capitalista, na qual o paralelo com o nazismo cumpre papel importante.

Mal comparando, é como se um ator fosse acusado de apologia ao nazismo por se caracterizar de Hitler numa peça ou filme de teor antinazista.

A denúncia, no entanto, tem sido ecoada pela imprensa mundial e também brasileira, que abre espaço para declarações e artigos de sionistas-bolsonaristas pretensamente indignados.

Mas é pura fake news.

Chegaram a inventar que Flávio Dino anunciara que ia prender Roger Waters. O ministro negou, disse que o caso ainda não chegou até ele e explicou o óbvio: crime é usar insígnias “para fins de divulgação do nazismo”.

Lançar acusações de anti-semitismo contra os críticos é a arma de Israel para interditar o debate sobre suas políticas expansionistas e genocidas. Na imprensa, na Universidade, em todos os espaços, os sionistas abusam deste estratagema.

A solidariedade ao povo palestino, porém, se impõe como dever moral para qualquer pessoa preocupada com os direitos humanos. Roger Waters merece nosso aplauso.

*Luis Felipe Miguel é professor do Instituto de Ciência Política da UnB. Autor, entre outros livros, de Democracia na periferia capitalista: impasses do Brasil (Autêntica).

Publicado originalmente na página do Facebook do autor.


A Terra é Redonda existe graças aos nossos leitores e apoiadores.
Ajude-nos a manter esta ideia.
CONTRIBUA

Veja neste link todos artigos de

10 MAIS LIDOS NOS ÚLTIMOS 7 DIAS

__________________
  • A colonização da filosofiamar estacas 14/11/2024 Por ÉRICO ANDRADE: A filosofia que não reconhece o terreno onde pisa corrobora o alcance colonial dos seus conceitos
  • A massificação do audiovisualcinema central 11/11/2024 Por MICHEL GOULART DA SILVA: O cinema é uma arte que possui uma base industrial, cujo desenvolvimento de produção e distribuição associa-se à dinâmica econômica internacional e sua expansão por meio das relações capitalistas
  • O entretenimento como religiãomóveis antigos máquina de escrever televisão 18/11/2024 Por EUGÊNIO BUCCI: Quando fala a língua do rádio, da TV ou da Internet, uma agremiação mística se converte à cosmogonia barata do rádio, da televisão e da internet
  • Ainda estou aqui — habeas corpus de Rubens Paivacultura ainda estou aqui 2 12/11/2024 Por RICARDO EVANDRO S. MARTINS: Comentário sobre o filme dirigido por Walter Salles
  • Os concursos na USPMúsica Arquitetura 17/11/2024 Por LINCOLN SECCO: A judicialização de concursos públicos de docentes na USP não é uma novidade, mas tende a crescer por uma série de razões que deveriam preocupar a comunidade universitária
  • A execução extrajudicial de Sílvio Almeidaqueima de livros 11/11/2024 Por MÁRIO MAESTRI: A denúncia foi patrocinada por uma ONG de raiz estadunidense, o que é paradoxal, devido à autoridade e status oficial e público da ministra da Igualdade Racial
  • O porto de Chancayporto de chankay 14/11/2024 Por ZHOU QING: Quanto maior o ritmo das relações econômicas e comerciais da China com a América Latina e quanto maior a escala dos projetos dessas relações, maiores as preocupações e a vigilância dos EUA
  • A falácia das “metodologias ativas”sala de aula 23/10/2024 Por MÁRCIO ALESSANDRO DE OLIVEIRA: A pedagogia moderna, que é totalitária, não questiona nada, e trata com desdém e crueldade quem a questiona. Por isso mesmo deve ser combatida
  • Ainda estou aquicultura ainda estou aqui 09/11/2024 Por ERIK CHICONELLI GOMES: Comentário sobre o filme dirigido por Walter Salles
  • Antonio Candido, anotações subliminaresantonio candido 16/11/2024 Por VINÍCIUS MADUREIRA MAIA: Comentários sobre os mais de setenta cadernos de notas feitos por Antonio Candido

PESQUISAR

Pesquisar

TEMAS

NOVAS PUBLICAÇÕES