A iniciativa privada, regida pelo lucro e pelas determinações do mercado, não cumpre papel central ou relevante para suprir as emergências de milhões de pobres e excluídos, tampouco figuras que ocupam pastas de relevo no governo. Todos sumiram, pois são nulidades que nada têm a contribuir neste momento gravíssimo da história brasileira
Por Kátia Gerab Baggio*
A pandemia de Covid-19 está desmontando, de maneira inclemente — como muitos analistas têm observado —, a falácia do discurso e das políticas econômicas neoliberais, de enxugamento do Estado, e ultraliberais, de defesa do Estado mínimo e privatização de praticamente todos os setores da economia, neste contexto de hiperglobalização dos mercados financeiros.
A iniciativa privada, regida pelo lucro e pelas determinações do mercado, não cumpre papel central ou relevante para suprir as emergências de milhões de pobres e excluídos. Pode fazer ações pontuais, mas a coordenação econômica e as políticas de massa são sempre do Estado, tanto nas situações emergenciais (como pandemias ou desastres, naturais ou não) como nas ações para combater as desigualdades.
Escutei na GloboNews um jornalista afirmar que, com a pandemia, faltava uma voz, no governo federal, que coordenasse as ações sociais. E que essa voz não era a de Onyx Lorenzoni, que tomou posse como ministro da Cidadania no dia 18 de fevereiro de 2020, sucedendo a Osmar Terra.
Alguém sabe o nome do secretário de Desenvolvimento Social, antiga pasta absorvida pelo Ministério da Cidadania?
Entrei, neste dia 1º. de abril, na página da Secretaria de Desenvolvimento Social e não consegui descobrir o nome do secretário(a). Há os nomes dos responsáveis pelas subsecretarias, mas não encontrei o nome do titular da Secretaria.
O Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, criado pelo ex-presidente Lula em janeiro de 2004, teve titulares que realizaram um trabalho importantíssimo no combate à fome, à miséria, à pobreza e às desigualdades sociais, principalmente Patrus Ananias, ministro da pasta de janeiro de 2004 a março de 2010 (governo Lula), e Tereza Campello, de janeiro de 2011 a maio de 2016 (governo Dilma).
Já escutei na GloboNews, nestas semanas de pandemia, referências ao trabalho de Betinho — como era conhecido o sociólogo Herbert de Souza, criador do projeto “Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida”, fundamental, sem dúvida — e à importância do Bolsa Família, mas nenhuma menção (repito: nenhuma) aos nomes de Lula, Dilma, Patrus ou Tereza Campello (registro que o Bolsa Família é um programa gerido pela pasta de Desenvolvimento Social, hoje Secretaria).
Sabemos, e não esqueceremos, que as corporações de mídia — principalmente a mais poderosa, o Grupo Globo, cujos veículos cumprem, agora, um importantíssimo papel informativo durante a pandemia de Covid-19 — tiveram um papel fundamental no processo de desestabilização da democracia e de demonização do PT como “partido mais corrupto do Brasil”, além do apoio a todas as reformas antissociais dos (des)governos Temer e Bolsonaro: EC 95 (teto de gastos), (contra)reforma trabalhista e (contra)reforma da Previdência, que iriam “salvar a economia brasileira”, lembram-se?
Agora, diante da tragédia mundial da Covid-19, todos os jornalistas e economistas, praticamente sem exceção, apelam ao Estado.
Onde estão figuras como Salim Mattar, titular da Secretaria Especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercados do Ministério da Economia?
Ou Abraham Weintraub, “ministro” da Educação que deveria estar nas coletivas do governo federal, mas que praticamente desapareceu, desde que a pandemia começou a se espalhar pelo país e se tornou um problema gigantesco e absolutamente urgente?
E o ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Marcos Pontes, por que não participa das coletivas?
E Damares Alves, titular do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos?
Sumiram, pois são nulidades que nada têm a contribuir neste momento gravíssimo da história brasileira.
Nós, historiadores, temos esse “vício” de ofício: não esquecer o passado, nem o remoto e nem o recente.
* Kátia Gerab Baggio é historiadora e professora de História das Américas na Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG