Benjamin Netanyahu e a extrema direita global

Imagem: Sera Cocora
Whatsapp
Facebook
Twitter
Instagram
Telegram

Por JORGE BRANCO*

Uma vitória eleitoral ou mesmo um ciclo de governos progressistas, não são suficientes, ainda que sejam importantíssimos, para derrotar a extrema direita global

O governo de Benjamin Netanyahu é hoje a maior referência política para a extrema direita global, cumprindo um papel de reorganizá-la. As derrotas eleitorais de Donald Trump e Jair Bolsonaro foram derrotas parciais para a extrema direita mundial, mas insuficientes para inabilitá-la definitivamente. A ofensiva militar do governo de Benjamin Netanyahu sobre a população e o território palestinos deu forma a uma política que alinhou diversas correntes de extrema direita pelo mundo.

Política é também contexto. Desde seu primeiro governo em 1996, na esteira da crise política que atingiu Israel após o assassinato de Yitzhak Rabin – primeiro-ministro que comandou os acordos de cessar-fogo entre judeus e palestinos nos anos 1990 –, Benjamin Netanyahu se constituiu como o líder das facções que negam a coexistência de dois Estados na região. E também de qualquer concessão por parte de Israel a fim de materializar algum pacto de paz, tal como o Acordo de Oslo, seu grande alvo no primeiro governo.

A crise política global de 2010 para cá, deu à Benjamin Netanyahu o ambiente, as condições políticas, para uma radicalização de sua política de extrema direita. Com a eleição de 2022, Benjamin Netanyahu chegou a seu sexto governo. Neste governo as políticas de segregação social e étnica contra o povo árabe avançaram solidificando sua política colonial sobre os territórios palestinos, inclusive sobre a Cisjordânia e não somente sobre Gaza. Israel caminha, pelas mãos da extrema direita, para afirmar-se como um Estado étnico-religioso e não como um Estado nacional e democrático.

Acusado de corrupção e liderando um governo de frente de extrema direita, composto por partidos sionistas radicais, partidos religiosos fundamentalistas e ampliando a força dos militares e das polícias, Netanyahu consolidou leis de discriminação étnica, políticas de anexação territorial e propostas desdemocratizantes. Se de um lado tem sido muito criticado e vem sofrendo a resistência da oposição democrática israelense e de organizações de defesa dos direitos humanos – que o caracterizam como um governo de apartheid social – de outro se transformou em referência das organizações e partidos de extrema direita pelo mundo.

No Brasil, por exemplo, após a derrota eleitoral para Lula no final de 2022 e a debelação da tentativa de golpe de Estado em janeiro de 2023, a extrema direita, liderada pelo bolsonarismo, reencontrou um ponto de unidade na defesa da política colonialista e religiosa de Benjamin Netanyahu. A ideia, ainda que difusa, de um Estado religioso, militarista, com eliminação de direitos sociais e que combata as premissas dos direitos humanos, funcionou com um toque de corneta para a remobilização de sua base social, conservadora e suscetível aos esquemas operativos das redes sociais bolsonaristas.

O provocativo encontro do embaixador de Israel no Brasil, Daniel Zonshine, com parlamentares de extrema direita e com o ex-presidente Jair Bolsonaro, demonstra que o governo israelense está, objetivamente, disposto a se relacionar com a extrema direita mundial e ultrapassar os limites diplomáticos das relações entre estados. Este mesmo embaixador já havia atacado o PT, partido principal da coalização do governo Lula, em uma atitude incomum para representantes de Estados estrangeiros.

A ofensiva militar de Israel provocou, após várias derrotas políticas e eleitorais, uma reanimação da extrema direita mundial. No Brasil, Estados Unidos, Argentina, Portugal, Espanha e Alemanha, a extrema direita procura empreender um novo movimento ofensivo. A tentativa de lawfare contra o governo de centro–esquerda em Portugal, as candidaturas de Javier Milei e Donald Trump, na Argentina e nos EUA respectivamente, a força da pressão da oposição de direita no Brasil e na Espanha, o ativismo e representatividade do neofascismo na Alemanha, se juntam aos governos da Hungria, Polônia e Itália em uma frente ultrarreacionária.

Uma vitória eleitoral ou mesmo um ciclo de governos progressistas, não são suficientes, ainda que sejam importantíssimos, para derrotar a extrema direita global. É a crise econômica global e a alta concentração de riqueza e poder em mãos dos super-ricos que alimentam essa conjuntura de ódio e escassez, ambiente propício ao ativismo da extrema direita. A disputa de valores, o que passa por denunciar a extrema direita pelo que é e pelo que faz sem rodeios ou tergiversações, é decisivo para um confronto sobre a continuidade das conquistas sócias das últimas décadas.

*Jorge Branco é doutorando em ciência política na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).


A Terra é Redonda existe graças aos nossos leitores e apoiadores.
Ajude-nos a manter esta ideia.
CONTRIBUA

Veja neste link todos artigos de

AUTORES

TEMAS

10 MAIS LIDOS NOS ÚLTIMOS 7 DIAS

Lista aleatória de 160 entre mais de 1.900 autores.
Plínio de Arruda Sampaio Jr. Berenice Bento Marcelo Módolo Francisco Pereira de Farias André Márcio Neves Soares Fernão Pessoa Ramos André Singer Renato Dagnino Antonio Martins Mariarosaria Fabris Henri Acselrad Liszt Vieira Sandra Bitencourt Armando Boito Claudio Katz Marilena Chauí Luciano Nascimento Marcos Silva Alexandre de Oliveira Torres Carrasco Julian Rodrigues Leda Maria Paulani Luiz Bernardo Pericás Celso Favaretto Afrânio Catani Igor Felippe Santos Atilio A. Boron Lucas Fiaschetti Estevez Lincoln Secco Paulo Sérgio Pinheiro Alexandre de Freitas Barbosa Eugênio Bucci Anderson Alves Esteves Vinício Carrilho Martinez Samuel Kilsztajn Juarez Guimarães Marcus Ianoni Paulo Nogueira Batista Jr Bernardo Ricupero Paulo Fernandes Silveira Paulo Capel Narvai Flávio Aguiar Ari Marcelo Solon Leonardo Avritzer Ronald Rocha Gabriel Cohn Bento Prado Jr. Gilberto Lopes Luiz Eduardo Soares Salem Nasser Tales Ab'Sáber Tadeu Valadares Denilson Cordeiro Matheus Silveira de Souza Ricardo Fabbrini Caio Bugiato José Machado Moita Neto Alexandre Aragão de Albuquerque Dennis Oliveira Priscila Figueiredo Flávio R. Kothe Manchetômetro Annateresa Fabris Tarso Genro Andrew Korybko Francisco Fernandes Ladeira Rubens Pinto Lyra Eliziário Andrade Ladislau Dowbor Daniel Costa Marjorie C. Marona Paulo Martins Milton Pinheiro Elias Jabbour Eugênio Trivinho João Lanari Bo Luís Fernando Vitagliano Otaviano Helene Marcos Aurélio da Silva Carla Teixeira Ronaldo Tadeu de Souza Érico Andrade Carlos Tautz Mário Maestri Jorge Branco Everaldo de Oliveira Andrade Michel Goulart da Silva Rodrigo de Faria Jorge Luiz Souto Maior Chico Whitaker Valerio Arcary Vanderlei Tenório Andrés del Río José Geraldo Couto José Micaelson Lacerda Morais João Sette Whitaker Ferreira Benicio Viero Schmidt Celso Frederico Fábio Konder Comparato Heraldo Campos Rafael R. Ioris Francisco de Oliveira Barros Júnior Kátia Gerab Baggio José Raimundo Trindade Gilberto Maringoni Sergio Amadeu da Silveira Eduardo Borges Alysson Leandro Mascaro Walnice Nogueira Galvão Eleutério F. S. Prado Luiz Roberto Alves Leonardo Boff Luiz Marques João Feres Júnior Antonino Infranca Lorenzo Vitral Luiz Renato Martins Daniel Brazil Vladimir Safatle Maria Rita Kehl Daniel Afonso da Silva Alexandre de Lima Castro Tranjan Marcelo Guimarães Lima Luiz Carlos Bresser-Pereira Bruno Machado José Dirceu Thomas Piketty Slavoj Žižek Remy José Fontana Michael Roberts Henry Burnett Eleonora Albano Osvaldo Coggiola Chico Alencar Luiz Werneck Vianna João Carlos Loebens Marilia Pacheco Fiorillo José Costa Júnior Michael Löwy Ronald León Núñez Ricardo Musse Fernando Nogueira da Costa Gerson Almeida João Carlos Salles Bruno Fabricio Alcebino da Silva Leonardo Sacramento Dênis de Moraes Yuri Martins-Fontes Airton Paschoa Antônio Sales Rios Neto Manuel Domingos Neto José Luís Fiori Jean Pierre Chauvin João Paulo Ayub Fonseca Boaventura de Sousa Santos Luis Felipe Miguel Ricardo Abramovay Ricardo Antunes João Adolfo Hansen Anselm Jappe Jean Marc Von Der Weid

NOVAS PUBLICAÇÕES