A desestabilização da Geórgia

Imagem: Genadi Yakovlev
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Por ANDREW KORYBKO*

Por que o Ocidente promove hostilidades para fomentar uma nova guerra híbrida no Cáucaso

O presidente do Parlamento da Geórgia exigiu uma explicação aos EUA depois que os serviços de segurança revelaram um plano de mudança de regime financiado pela USAID na capital Tbilisi. Três sérvios do CANVAS (Centro de Ação e Estratégias Não-Violentas Aplicadas), a organização responsável por organizar a “Revolução Bulldozer” de seu país em 2000, foram detidos há uma semana por suspeita de terem ensinado os chamados “ativistas” locais como derrubar o governo. Depois de terem sido interrogados, partiram para o estrangeiro, mas o escândalo sugere um esforço renovado de desestabilização no país.

Antes deste último incidente, a Geórgia acusou a Ucrânia de estar planejando distúrbios contra suas autoridades, o que Kiev, obviamente, negou. No entanto, por coincidência, o deputado ucraniano Aleksey Goncharenko escreveu no Telegram, durante o fim de semana, que “Nós estamos prontos para ser aliados dos EUA em todas as operações militares, mais fortemente do que a Grã-Bretanha”. Esta afirmação surgiu na sequência de notícias de que a Ucrânia teria efetuado ataques com drones contra rebeldes sudaneses alegadamente apoiados pela Rússia, presumivelmente a mando dos EUA, caso seja verdade.

Neste contexto, as afirmações dos serviços de segurança de cumplicidade ucraniana na mais recente intriga de mudança de regime de seu país são credíveis, apesar de Kiev não ter sido diretamente implicada no escândalo da semana passada. Por conseguinte, surge naturalmente a questão de saber por que a Geórgia está sendo visada, uma vez que se trata de um país pró-ocidental que deseja oficialmente aderir à União Europeia e à OTAN. O que está acontecendo agora é, na verdade, a segunda fase do mesmo processo que foi posto em marcha há meio ano.

Em março, os Estados Unidos tentaram derrubar o governo daquele país, alegando que a legislação sobre agentes estrangeiros que propunham, inspirada na dos Estados Unidos, era supostamente indicativa de um desejo secreto de se aproximar da Rússia. Esta suposição não era verdadeira, mas serviu para provocar uma Revolução Colorida que acabou fracassando, e que tinha como objetivo abrir uma segunda frente de guerra por procuração na Nova Guerra Fria.

As análises que se seguem detalham as maquinações estratégicas em jogo e expõem o falso pretexto por trás dessa conspiração: (i) “A Geórgia é alvo de uma mudança de regime devido à sua recusa em abrir uma ‘segunda frente’ contra a Rússia”; (ii) “A retirada pela Geórgia de seu projeto de lei sobre agentes estrangeiros inspirado nos EUA não vai por fim à pressão ocidental”; (iii) “A Rússia chamou a atenção dos EUA para os duplos padrões em relação à Geórgia-Moldávia e à Bósnia-Sérvia”; (iv) “Expondo os duplos padrões dos EUA em relação a outras leis sobre agentes estrangeiros semelhantes ou idênticas”.

O governo conservador-nacionalista da Geórgia tem uma política surpreendentemente pragmática em relação à Rússia, apesar de ainda querer oficialmente aderir à UE e à OTAN, de tal forma que se recusou a impor sanções contra ela ou a fazer ameaças por causa da Abcásia e da Ossétia do Sul. Por essa razão, o Ocidente começou a preparar seus procuradores liberal-globalistas para se revoltarem como uma punição, com o objetivo de pressioná-los a inverter sua posição ou de substitui-los por fantoches mais complacentes, caso continuem recusando-se a fazê-lo.

Esta campanha foi forçada a entrar em ação prematuramente em resposta à legislação iminente do governo que lhes teria permitido gerir melhor estas crescentes ameaças liberal-globalistas e, assim, eventualmente neutralizá-las a tempo. O Ocidente sentiu que sua janela de oportunidade para abrir uma segunda frente contra a Rússia através da Geórgia estava fechando-se rapidamente, razão pela qual deu a ordem para iniciar as hostilidades da guerra híbrida em março.

Essa crise terminou quase tão depressa como começou, depois que o governo retirou prontamente o projeto de lei e, por conseguinte, removeu a base sobre a qual os grupos liberal-globalistas exigiam sua demissão. O resultado final foi o estabelecimento de uma espécie de cessar-fogo, em que todos concordaram informalmente em congelar a situação por enquanto, por conveniência mútua. A razão pela qual tudo se descongelou no último mês tem a ver com uma combinação de desenvolvimentos internos e regionais.

Na frente interna, o governo conservador-nacionalista deu início a um processo de impeachment do presidente liberal-globalista do país, o que a oposição apoiada pelo Ocidente considerou uma jogada de poder que violou o cessar-fogo informal da primavera. Simultaneamente, o governo liberal-globalista da vizinha Armênia começou a afastar-se decisivamente da Rússia em direção ao Ocidente, o que representou um jogo de poder regional que, inadvertidamente, pôs fim ao conflito de Karabakh, como explicado abaixo: (i) “As três últimas provocações anti-russas da Armênia correm o risco de desencadear um novo conflito em Karabakh”; (ii) “De Korybko para os meio de comunicação holandeses: o fim do conflito de Karabakh revolucionará a região”; (iii) A ‘limpeza étnica’ artificialmente fabricada de Karabakh é uma manobra política da diáspora”; (iv) “O Kremlin reagiu contra as falsas afirmações sobre a situação em Karabakh”.

Após o fracasso do Ocidente em abrir uma segunda frente contra a Rússia no Sul do Cáucaso através da Geórgia, este bloco voltou-se para seu “Plano B” de tentar fazê-lo através da Armênia, provocando outro conflito em Karabakh que poderia ter arrastado o Kremlin para uma conflagração regional se não tivesse sido cuidadoso. Depois deste plano também ter fracassado, o Ocidente começou imediatamente a aterrorizar sobre “limpeza étnica” e “genocídio”, o que serviu para amedrontar cerca de 100.000 armênios de Karabakh, levando-os a mudarem-se voluntariamente para a Armênia.

O objetivo por trás da provocação deste fluxo populacional em grande escala era utilizar estas chamadas “Armas de Migração em Massa” para pressionar o governo armênio a completar sua orientação pró-ocidental anti-Rússia, depois de parecer estar em dúvida, ou a substituí-la por uma Revolução Colorida, caso se recuse. Esse plano ainda está em curso, mas caso seja implementado com sucesso e não seja compensado por uma revolução verdadeiramente patriótica e multipolar, a Armênia irá provavelmente retirar-se da CSTO [Organização do Tratado de Segurança Coletiva] liderada pela Rússia.

O ministro das relações exteriores, Sergei Lavrov, já se conformou com este cenário, depois de descrevê-lo recentemente como uma “escolha soberana” do país, mas as consequências regionais continuarão sendo administráveis enquanto a OTAN não tiver um acesso confiável à Armênia. É aí que reside a importância estratégica renovada da Geórgia, uma vez que seu governo conservador-nacionalista pragmático não é suscetível de facilitar o jogo de poder do bloco, razão pela qual é alvo de uma nova tentativa de afastamento e justamente neste momento.

Em suma, a iminente retirada da Armênia da CSTO só será substancial se a OTAN garantir um acesso confiável a ela através da Geórgia, mas não se espera que as autoridades em exercício desta última concordem com isso. É por isso que está sendo preparada uma nova rodada de instabilidade por meio de uma Revolução Colorida, sob o pretexto de “protestar” contra o processo de impeachment do presidente liberal-globalista. Se o Ocidente ganhar, poderá abrir-se uma segunda frente contra a Rússia no Sul do Cáucaso, e é por isso que é imperativo que este último jogo de poder fracasse.

*Andrew Korybko é mestre em Relações Internacionais pelo Instituto Estadual de Relações Internacionais de Moscou. Autor do livro Guerras híbridas: das revoluções coloridas aos golpes (Expressão Popular). [https://amzn.to/46lAD1d]

Tradução: Fernando Lima das Neves.


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